Título da obra: O Profeta da Fome

Maurice Carlos Capovilla (Valinhos, São Paulo, 1936). Diretor de cinema, roteirista e professor. Seus documentários e narrativas ficcionais têm como questões centrais a sobrevivência e as condições de vida do povo brasileiro inserido no sistema capitalista.
Cresce em Campinas e muda-se para São Paulo aos 21 anos. No fim dos anos 1950, frequenta a filmoteca do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM/SP), um dos primeiros cineclubes de São Paulo, ao lado dos críticos e diretores de cinema Jean-Claude Bernardet (1936) e Gustavo Dahl (1938-2011). Entre 1958 e 1961, cursa filosofia na Universidade de São Paulo (USP) e, ainda estudante, trabalha como repórter do jornal O Estado de S. Paulo e no departamento de difusão de filmes da Cinemateca Brasileira.
Em 1962, dirige seu primeiro curta-metragem, União. Em 1963, estagia no Instituto de Cinematografia da Universidade do Litoral de Santa Fé, na Argentina, onde cursa direção e produção documentária. Ao retornar ao Brasil, grava Meninos do Tietê (1963), que no mesmo ano recebe o prêmio de melhor filme na 1ª Semana Latino-Americana de Cinema Documental, em Buenos Aires. Trabalha como repórter no jornal Última Hora até o início do ano seguinte.
Após a saída do jornal, realiza o documentário Subterrâneos do Futebol (1964), com produção do húngaro Thomas Farkas (1924-2011). Nesse filme, Capovilla analisa o futebol brasileiro com base em suas práticas extracampo e apresenta o ângulo pouco glorioso da vida de jogadores que fazem parte desse mercado esportivo. Em 1965, lança o documentário Esportes no Brasil. Entre 1965 e 1967, trabalha como editor e crítico cinematográfico no Jornal da Tarde. Nesse período, torna-se professor na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP.
Em 1967, escreve, dirige e produz seu primeiro longa-metragem, Bebel, Garota Propaganda, baseado em um conto do escritor Ignácio de Loyola Brandão (1936). Com ele, Rossana Ghessa (1943) ganha o prêmio de melhor atriz no Festival de Brasília de 1967. Como em Subterrâneos do Futebol, essa narrativa também apresenta os bastidores de mercados sofisticados, ao retratar a história de uma moça pobre contratada como modelo de anúncio de sabonetes e que passa a alimentar sonhos de riqueza e sucesso. O curto êxito da personagem provoca a reflexão acerca da descartabilidade das pessoas quando não há mais interesse mercadológico e o questionamento dos valores veiculados pela indústria cultural, além de retratar a banalização da mulher.
Em 1968, participa do Comitê Internacional do Cinema Novo para lutar contra a censura. Em 1970, dirige seu segundo longa, O Profeta da Fome, premiado no mesmo ano com o melhor argumento e roteiro no Festival de Brasília e melhor filme no Prêmio Molière no Air France do Cinema. O filme é inspirado no texto Estética da Fome, do diretor de cinema Glauber Rocha (1939-1981), e dialoga com o cinema marginal, que surge como um movimento de produções baratas e sem muitas condições técnicas. O longa debate a inserção do próprio artista na indústria cultural por meio da história do faquir de um circo interiorano em decadência. O personagem se transforma numa espécie de “santo” graças à “industrialização de sua fome”, o que converte sua desgraça em atração popular. Com cenas de canibalismo, o filme retrata a submissão da plateia ante um espetáculo de degradação e a trágica sobrevivência dos circenses. Formalmente, incorpora a narrativa fragmentada do cinema moderno e a metalinguagem.
Dirige O Jogo da Vida em 1977, que garante o Kikito do Festival de Gramado de melhor atriz coadjuvante para Myriam Muniz (1931-2004), em 1978. O filme, que é uma adaptação do conto Malagueta, Perus e Bacanaço, do jornalista João Antônio (1937-1996), aborda a vida de três marginais que, em busca de sobrevivência, pretendem tirar proveito de um jogo de sinuca.
Trabalha também para emissoras de TV. Na Rede Globo, é diretor da série Globo Shell (1971) e do Globo Repórter (1972-1975). Na Rede Bandeirantes (1981-1983), é diretor de núcleo e exibe os primeiros telefilmes brasileiros.
Em 2003, lança o longa Harmada, uma adaptação do romance de João Gilberto Noll (1946-2017). Com algumas características comuns em relação aos filmes anteriores, o último longa tem como traço distintivo a abordagem da questão existencial. A representação da trajetória de um ator, o personagem central, conta com traços do surrealismo, por ter uma trama desconexa, com personagens que desaparecem no meio do filme sem explicações, o que faz o espectador pensar sobre a efemeridade da vida. Filmada propositalmente com câmera improvisada, a narrativa sugere o papel da arte como o verdadeiro caminho para atingir a liberdade humana.
Com narrativas de cunho épico e o convite ao público para a reflexão sobre as desigualdades sociais, a obra de Maurice Capovilla se dedica a representar as circunstâncias de vida num país da periferia do capitalismo.
Teatro de Arena
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