Artigo sobre Excesso

Paço das Artes
Os irmãos Humberto Campana (Rio Claro, São Paulo, 1953) e Fernando Campana (Brotas, São Paulo, 1961) são designers e professores. Humberto forma-se em direito pela Universidade de São Paulo (USP), em 1977, mas não exerce a profissão. Na década de 1980, frequenta cursos livres de escultura em metal e argila, na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap), e de joalheria, com o joalheiro Renato Camargo. Fernando gradua-se em arquitetura pela Faculdade de Belas Artes de São Paulo, em 1984.
A formação de ambos tangencia as artes visuais e isso se refete seus projetos de design. Apresentam a primeira coleção de móveis, em 1989, organizada pela empresa A Arquitetura da Luz, em São Paulo. Com o título Desconfortáveis, essa coleção destaca-se em um período em que o funcionalismo é uma constante no design de mobiliário.
Na segunda metade da década de 1990, a carreira dos irmãos adquire projeção internacional. Em 1996, realizam exposição individual no Palazzo Reale, em Milão, e participam da exposição coletiva Brasil Faz Design, no Museu da Casa Brasileira, em São Paulo. Em 1997, têm peças incluídas nas publicações Design Year Book e nas edições organizadas pelo historiador americano de design Mel Byars (1938), 50 Chairs e 50 Tables[1]. No mesmo ano, são selecionados pelo designer francês Philippe Starck (1949) para a mostra Design Der Zukunft, no Folk Museum, em Bremen, Alemanha. Nesse ano também lançam no Salão do Móvel de Milão a luminária Estela, produzida para a Oluce, empresa italiana de iluminação.
Em 1998, são convidados pela curadora de design e arquitetura do Museum of Modern Art de Nova York (MoMA/NY), Paola Antonelli (1963), para uma retrospectiva. Lecionam no curso de desenho industrial na Faap, em 1998, e no Museu Brasileiro de Escultura (Mube), de 1999 a 2000. Recebem diversos prêmios, com destaque para o Prêmio George Nelson Design Award, da revista Interiors, Estados Unidos, em 1999; o Le Prix du Nombre d’Or, Salon du Meuble, de Paris; e o Dim Award, da Feira Internacional de Móveis de Valência, Espanha, pela cadeira Corallo, em 2005. Suas criações fazem parte de acervos de museus como MoMA, o Centre Georges Pompidou, Paris, e Vitra Design Museum, Alemanha.
O trabalho de Humberto e Fernando Campana é caracterizado pela ousadia das formas e pelo arrojo dos materiais, que refletem ironia e humor. Dada a dificuldade de produção de mobiliário no Brasil, eles privilegiam, nos primeiros projetos, o uso de matérias-primas em que é possível tirar proveito do erro e da falta de acabamento. Elegem materiais que fazem parte do cotidiano. Seus projetos incorporaram ferro, alumínio, materiais naturais e reciclados, arames de alumínio, barbante, ripa, sintéticos, plásticos, pvc, forma de pizza, mangueiras de jardim etc. Os irmãos Campana buscam leveza, ironia e originalidade e, por essas características, destacam-se no cenário internacional.
A partir de 1999, o trabalho é reconhecido em todo o mundo e passam a dar mais atenção às discussões formais do próprio design. Preocupam-se com a funcionalidade, com o conforto do usuário e a produção em escala industrial para baratear os produtos. Todavia não perdem o que eles mesmos chamam de “poesia de projeto”. Pensando na relação entre produto e artesanato, Paola Antonelli destaca na obra dos Campana a preservação, com produtos reciclados e artesanais, da cultura brasileira.
Ampliando essa discussão, o crítico de arte Tadeu Chiarelli (1956) considera que os objetos criados pelos designers “tendem a resistir, como obras de arte, ao processo de ‘desaparecimento’ que sofre grande parte dos objetos dos quais nos utilizamos no cotidiano”[2]. Para ele, as peças resistem pela forma, pelo material e, principalmente, pelo estímulo à nossa memória histórica e afetiva. Um exemplo é a mesa Tatoo, que branca, em metal, com recortes vazados, faz referência às toalhas de crochê. Diferente das primeiras cadeiras Desconfortáveis, esse é um objeto de design preocupado com o conforto.
1. A Mesa Inflável (1995), de autoria dos Campana, é escolhida para a capa de 50 Tables. O organizador da coleção, Mel Byars, elegeu-a por se tratar de uma mesa barata, divertida e surpreendentemente funcional, como ele mesmo declara. Ver texto de Adélia Borges no catálogo Retrospectiva Campana. Rio de Janeiro: Casa França Brasil, 1999.
2. Ver Entre o design e arte: irmãos Campana; Entre a arte e o design: acervo do MAM. São Paulo: MAM, 2000, p. 49.
Paço das Artes
Museum of Contemporary Art Tokyo
Museu Vale (Vila Velha, ES)
Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB)
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