Artigo sobre Amatori e Cultori

Vittorio Brecheret (Farnese, Itália, 1894 – São Paulo, Brasil, 1955). Escultor. O artista é um dos precursores do movimento modernista brasileiro nas artes. Sua obra é marcada pela busca incessante de diferentes técnicas da escultura, do mármore à terracota, e de temas relevantes da cultura nacional.
Inicia sua formação artística em 1912, no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo (Laosp), onde estuda desenho, modelagem e entalhe em madeira. Em 1913, viaja para Roma e torna-se discípulo de Arturo Dazzi (1881-1966), escultor italiano que se destaca pelo gosto por figuras monumentais elaboradas com grande síntese formal. Em Roma, estuda atentamente as obras de Auguste Rodin (1840-1917), considerado o precursor da escultura moderna, e se aproxima de seu naturalismo. Conhece também o escultor croata Ivan Mestrovic (1883-1962), cuja linguagem dramática e heroica fascina Brecheret e o influencia. Ainda na Itália, participa de algumas mostras coletivas e recebe destaques da crítica.
Quando retorna a São Paulo, em 1919, já é um escultor com amplo domínio técnico. Improvisa um ateliê em espaço cedido pelo engenheiro Ramos de Azevedo (1851-1928) no Palácio das Indústrias. É descoberto por modernistas como Di Cavalcanti (1897-1976), Mário de Andrade (1893-1945) e Oswald de Andrade (1890-1954), que passam a divulgar sua obra.
São de 1919 as esculturas Ídolo e Eva, que apresentam um tratamento naturalista da anatomia e uma contida dramaticidade, expressa por meio de torções do corpo e de volumes trabalhados em luz e sombras acentuadas. Mário de Andrade denomina esse período da obra de Brecheret (em oposição à época posterior, em Paris) de fase de sombras, na qual estas sempre se valorizam mais do que a luz. Em 1920 o escultor realiza a maquete para o Monumento às Bandeiras, no qual evoca a saga dos bandeirantes na conquista de novas terras. No ano seguinte, recebe bolsa de estudo do Pensionato Artístico do Estado de São Paulo e viaja para Paris.
Embora ausente, participa da Semana de Arte Moderna de 1922 com 12 esculturas de diferentes dimensões e materiais. Entre as peças está a famosa Cabeça de Cristo (nº 7), mais conhecida como Cristo de Trancinhas, obra em bronze polido de uma cabeça com expressão funérea e a boca semiaberta, emoldurada por duas tranças. De acordo com Daisy Peccinini, a escultura, que pertence a Mário de Andrade, causa polêmica na época e inspira este autor na escrita de Paulicéia Desvairada (1922).
Em Paris, Brecheret busca fundir três fontes de maneira pessoal: a ênfase ao volume geométrico da escultura cubista, o tratamento sintético da forma dado pelo escultor romeno Constantin Brancusi (1876-1957) e a estilização elegante do art déco. A convergência dessas matrizes pode ser percebida em Tocadora de Guitarra (1923). Nessa fase, o escultor reduz a dramaticidade vista em suas obras anteriores, produzindo formas simplificadas e de forte cunho ornamental.
A escultura Mise au Tombeau [O Sepultamento], de 1923 – no Cemitério da Consolação, em São Paulo – é uma das obras de maior destaque de seu período francês. Organizada em formas lineares, tem uma suavidade melódica, e o tema é tratado com muita simplificação formal, evocando um clima de grande serenidade.
Em 1936, depois de tantos anos alternando sua estada entre França e Brasil, Victor Brecheret fixa-se em São Paulo, onde recebe encomendas de esculturas públicas e também de trabalhos com temas religiosos. Retoma o projeto do Monumento às Bandeiras, concluído apenas em 1953. A obra se destaca pelas figuras elaboradas com grande síntese formal, pela preocupação com os volumes e pela simplificação dos detalhes e linhas estilizadas. O monumento consegue resumir o apelo narrativo e alegórico do tema: em sua composição convergem uma forte marcação horizontal e um movimento de arrasto que culmina na figura da Glória, que enfeixa heroicamente todo o grupo escultórico. O tratamento da superfície é mais áspero, se comparado ao de obras anteriores, enfatizando a matéria.
A partir da década de 1940, o artista se aproxima dos temas ligados à cultura indígena, em esculturas realizadas em bronze ou terracota. Nessa fase, em que alcança o ponto alto de sua carreira, também trabalha com pedras de formas circulares, nas quais interfere realizando suaves incisões, como nas obras Luta da Onça ou Índia e o Peixe (1947/1948). Nestas, evoca o caráter sagrado ou mágico das pedras e retoma, assim, de maneira muito pessoal, formas e arquétipos indígenas, ainda que se aproxime da escultura do inglês Henry Moore (1898-1986) e do alemão Hans Arp (1886-1966). Em trabalhos como Luta dos Índios Kalapalos (1951) produz formas nas quais dialoga com a abstração. Em Índio e Suassuapara (1951), o artista parte de dois volumes que se aglutinam e trabalha superfícies vazias ou cheias, nas quais se inserem incisões.
Variando entre a intensa dramaticidade de corpos e rostos e a simplicidade das formas, Victor Brecheret contribui para a constituição de uma arte autenticamente brasileira, ainda que com influências externas importantes. Sua obra vasta e diversificada tecnicamente revela uma história nacional, cuja identidade poética se traduz em um caráter de síntese formal e requintada simplicidade.
Casa Byington (São Paulo, SP)
Casa Byington (São Paulo, SP)
Theatro Municipal de São Paulo
Maison de L'Amérique Latine (Paris, França)
Musée Galliera (Paris, França)
Palais de Bois (Paris, França)
Société des Artistes Indépendants (Paris, França)
Fundação Bienal de São Paulo
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